terça-feira, 22 de abril de 2014

A Publicidade, a Internet e a nova Galáxia

Como a publicidade pode utilizar a internet para criar fenômenos “virais”?

INTRODUÇÃO
Desde o surgimento da internet a publicidade vem buscando a fórmula mais eficiente para divulgar os produtos de seus clientes usando os diversos formatos de mídia contidos nessa tecnologia, como blogs, e-mails, redes sociais e etc. Antes de mais nada, é muito importante entender como cada mídia funciona e então ficará mais fácil deduzir a melhor maneira de utilizá-la.
Algumas tecnologias causam mais impacto que outras, mas toda vez que uma nova tecnologia surge e passa a ser usada por um grande número de pessoas, ela altera o comportamento da sociedade que a utiliza. Marshall McLuhan trata desse assunto no livro “A Galáxia de Gutenberg”:
“(...) Qualquer nova tecnologia de transporte ou comunicação tende a criar seu respectivo meio ambiente humano. O manuscrito e o papiro criaram o ambiente social o qual pensamos em conexão com os impérios da Antiguidade. O estribo e a roda criaram ambientes únicos de enorme alcance. Ambientes tecnológicos não são recipientes puramente passivos de pessoas, mas ativos processos que remodelam pessoas e igualmente outras tecnologias. Em nosso tempo, a súbita passagem da tecnologia mecânica da roda para a tecnologia do circuito elétrico representa uma das maiores mudanças de todo o tempo histórico. (...)”.

Nos dias de hoje, nos causa estranheza observar uma sociedade que tenha um grande número de analfabetos em suas fronteiras. É indiscutível o impacto que a prensa causou na sociedade, assim como o aumento do acesso à cultura gerado por essa tecnologia. Mais tarde surgiram meios de comunicação de massa, como a TV e o rádio, e individuais, como o telégrafo, o telefone, o fax, que transformaram o mundo em uma grande “Aldeia Global”. Agora, a massiva difusão do acesso à internet nos apresenta uma nova forma de comunicação audiovisual que fatalmente irá impactar nossa forma de observar e interagir com o mundo. Os estudos sobre esse impacto ainda estão em seus primórdios, mas, com base nas palavras de McLuhan, podemos antecipar sua importância:

“(...) Agora na idade da eletricidade, a própria instantaneidade da coexistência entre nossos instrumentos tecnológicos deu lugar a crise sem precedente na história humana. As extensões de nossas faculdades e sentidos passaram a constituir um campo único de experiência que exige se fazer coletivamente consciente. Nossas tecnologias, à semelhança de nossos sentidos particulares, exigem agora um intercurso e mútuo relacionamento que torne possível sua coexistência racional. Enquanto nossas tecnologias foram tão lentas quanto a roda ou o alfabeto ou o dinheiro, o fato de se terem constituído sistemas separados e fechados foi, social e psiquicamente, suportável. Já isto não se pode dar agora, quando a visão, o som e o movimento são em toda extensão simultâneos e globais.(...)”

Este trabalho visa a apontar algumas formas como a internet vem incentivando comportamentos que podem ser úteis na disseminação de informações específicas para uso publicitário.


SEIS GRAUS DE SEPARAÇÃO
Richard Dawkins cunhou o termo “meme” para designar uma unidade de informação que se propaga de pessoa para pessoa. Esse termo, no entanto, tornou-se popular na descrição de um fenômeno cultural típico das redes sociais. Nesse caso, um meme passa a ser a denominação de uma informação disseminada e reproduzida através da internet de indivíduo para indivíduo até tomar dimensões altamente relevantes. Esse fenômeno também pode ser chamado de “viral”, quando fica evidente que a propagação da informação deu-se de forma natural, quando um usuário das redes sociais repassa um vídeo, foto ou texto para seus círculos de amizade e essa informação se espalha até ser conhecida em múltiplos círculos sem qualquer ligação ou contato aparente entre si.
As redes sociais não são apenas exemplos típicos de mídias responsáveis pelo fenômeno de viralização de conteúdo como são um bom exemplo de como se dá essa viralização. Desde o começo, os adeptos das redes sociais passaram a se associar a esses meios através da antiga divulgação “boca a boca”, como o fenômeno viral ou meme era originalmente chamado. Ou seja, um amigo convidava o outro a participar de uma rede social, que convidava um próximo e assim por diante até o acesso à rede social se espalhar e frequentemente se tornar um fenômeno global.
De acordo com “a teoria dos seis graus de separação”, desenvolvida antes mesmo da popularização das redes sociais na internet, essa forma de comunicação pode ser extremamente eficiente já que, teoricamente, estaríamos conectados a qualquer outro ser humano no mundo, sendo necessárias apenas seis pessoas ligadas por seus círculos de contatos para realizar a conexão com um alvo específico. Dessa forma, em uma sociedade extremamente globalizada, todos os indivíduos do planeta seriam capazes de influenciar as decisões uns dos outros mutuamente. Acredito que seja evidente a intensificação dessa interligação mundial criada pela expansão no uso da internet.
Essa amplificação na quantidade e velocidade de contatos cria uma nova forma de sociedade, a “sociedade virtual”, onde grupos se formam ligados mais por interesses comuns e culturas afins do que por fronteiras geográficas ou políticas. As implicações desse processo, no entanto, ainda seguem as mesmas regras de qualquer sociedade convencional, como foi convencionado por Durkheim e Aristóteles. Apesar de as relações parecerem ser apenas superficiais em um primeiro olhar, percebemos em um segundo momento que somos realmente interdependentes já que usamos a internet para trabalhar, comprar, conseguir oportunidades e interagir afetivamente como em um ambiente real.
Durkheim demonstra que em uma sociedade complexa, composta por indivíduos altamente especializados, como na que vivemos hoje, o ser humano se torna ainda mais interdependente e incapaz de sobreviver fora dos limites dessa sociedade e da relação de “solidariedade orgânica”. Portanto, quando dividimos conteúdos pelas redes sociais, ou e-mails, ou blogs, etc, estamos fortalecendo nossos laços sociais e criando uma cultura comum aos membros dessa enorme sociedade. Precisamos, necessariamente, estabelecer signos, ícones, índices, símbolos e linguagem que se tornem comuns aos membros dessa sociedade virtual para nos estabelecermos como indivíduos que fazem parte de algo maior. Dentro dessa sociedade precisamos criar elos e coesão assim como fazemos na sociedade física.
Dividir o máximo de nossas referências culturais com os membros de nossos círculos de amizade virtual gera uma maior capacidade de compreensão entre os membros desse círculo, que passam a compartilhar uma gama maior de símbolos concomitantes, muitíssimo necessários para todo tipo claro de comunicação. Em outras palavras, não se pode discutir um determinado assunto se todos os membros envolvidos no debate não estiverem cientes das referências culturais necessárias para o enriquecimento da retórica.
Contudo, dentro de cada círculo de contatos virtuais, cada um de seus membros possui outros círculos e também desejam construir repertórios comuns dentro deles e assim por diante. E dessa forma, o fenômeno viral se torna altamente desejável para toda sociedade virtual mais ampla e aqui esbarramos em um obstáculo que se torna evidente quando estudamos a semiótica: Para disseminar referências culturais em uma sociedade tão ampla será necessário que haja uma base simbólica comum para a compreensão do conteúdo.


REFORÇO POSITIVO
Para que a mensagem se espalhe de forma tão universal, ela deve gerar interesse universal e causar empatia instantânea em culturas distantes geograficamente e, portanto, diferentes em suas origens e com referências culturais distintas e múltiplas.
Fica assim evidente que existe uma necessidade inata de tornar o repertório cultural de um grande número de círculos de contatos comum à maioria dos membros de toda sociedade virtual, mas nem todo repertório divulgado em um círculo irá se propagar. Os membros de cada círculo irão utilizar as ferramentas disponíveis nas redes como dispositivos de “reforço positivo” para classificar os conteúdos de maior interesse desde o círculo de origem até a disseminação por toda a sociedade virtual.
Dessa forma sempre que aprovamos a iniciativa de um membro de nosso círculo na divulgação de um conteúdo, estamos incentivando e reforçando essa prática ao recompensar o componente do círculo com nossa atenção e, dessa forma, acabamos por filtrar quais conteúdos nos causaram maior interesse, como demonstra Skinner em sua “Teoria do Reforço. As constantes recompensas que vêm na forma de demonstrações de aprovação e propagação de uma informação na sociedade virtual fazem com que os indivíduos dentro dessa sociedade criem, reproduzam e compartilhem mais conteúdos semelhantes aos que foram bem recebidos anteriormente.
“Os homens são felizes em um meio ambiente no qual o comportamento ativo, produtivo e criativo é reforçado de forma efetiva.”


APROPRIAÇÃO DE SÍMBOLOS UNIVERSAIS
Durante todo o tempo que passamos em uma rede social nos deparamos com utilização coletiva de ícones da cultura pop, citações atribuídas a autores amplamente conhecidos, mesmo que erroneamente, e todo tipo de utilização de imagem de figuras públicas ou de apelo universal, como imagens de paisagens, bebês, animais, etc, na busca individual de estabelecer uma comunicação comum com múltiplas camadas da sociedade virtual, para que assim o indivíduo possa atingir o maior número de demonstrações de interesse coletivo possível.
Oras. Não seria difícil demonstrar que os membros desses círculos virtuais se utilizam instintivamente das mesmas técnicas publicitárias que os impactaram constantemente ao longo de suas vidas. Contudo, o impacto que um amigo provoca no outro ao utilizar sua rede social pode ser muito mais intenso que o de um anúncio veiculado por uma agência, empresa ou comércio, já que não percebemos em nossos amigos a intenção de lucrar ou obter alguma vantagem ao compartilhar determinada informação a não ser a de estabelecer uma referência cultural comum.


CONCLUSÃO
Para que a publicidade possa utilizar essas mídias como ferramenta de divulgação, basta entender como cada mídia funciona e agir dentro dela da mesma maneira que se agiria para criar um fenômeno de divulgação boca a boca existente no tempo anterior a essa tecnologia. Ou seja, através de boatos, degustações e criações que gerem conteúdos de interesse e linguagens universais, como o humor e o romance. Mas, mais que isso, é necessário conhecer as opiniões e assuntos em voga na sociedade virtual para não correr o risco de cometer uma “gafe” e produzir uma campanha que produza exatamente o efeito contrário do que se espera dela.

Logo abaixo temos o exemplo de uma boa peça publicitária feita com o propósito de ser divulgada nas redes sociais. A campanha original busca uma identificação com o público brasileiro usando um elemento de sua cultura gastronômica; no entanto, essa peça publicitária somente se tornou um viral devido a um incidente espontâneo. O representante da empresa, responsável pela divulgação da peça, tinha os elementos culturais certos para interagir com o cliente e gerar empatia em uma gama enorme de círculos que compartilham das mesmas referências culturais que eles. Repare que se você não for um membro desse gigantesco círculo e não possuir o repertório necessário, você simplesmente não entenderá o que o diálogo oculta. O que parece ser um convite para um café, na verdade é uma apropriação de um ícone de cultura pop muito popular no Brasil. Os que entendem o código secreto por traz do diálogo sentem-se fazendo parte do círculo e não resistem ao impulso de compartilhar a peça.

(O dialogo da peça reproduz as falas de Prof. Girafales e de Dona Florinda, personagens do popularíssimo seriado "Chaves")


BIBLIOGRAFIA

McLuhan, Marshall, A Galáxia de Gutenberg: A Formação Do Homem Tipográfico: Editora Nacional, 1977.

Dawkins, Richard, O Gene Egoísta. Reino Unido: Oxford University Press, 1976.

Durkheim, Émile, Da divisão do trabalho social, 1893.

Skinner, Frederic, Tecnologia do Ensino, 1972

Meme, http://pt.wikipedia.org/wiki/Meme, 11/04/2014

Semiótica, http://pt.wikipedia.org/wiki/Semi%C3%B3tica, 15/04/2014

A teoria dos seis graus de separação, http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria-dos-seis-graus-de-separa%C3%A7%C3%A3o, 03/04/2014

O conceito de animal político em Aristóteles, http://www.brasilescola.com/filosofia/o-conceito-animal-politico-aristoteles.htm 04/04/2014

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